Desde 01 de Março de 2022

ELEGIA II

Fernando Freire, poeta, prof de História

I
sim, eu sei, o frio de teus olhos vem do
vento bailando nas ruas ao som desta
sinfonia de gritos e sussurros
de humana imperfeição.

bela e temível é a noite com mãos
de cetim, postas sobre tua fronte
de mil caminhos, onde reluzem as
chagas do mundo biológico.

te vestes de roxo-negro-laranja
& procuras no palato da noite lâminas de
estricnina que seccionem a veia pustulenta,

hoje que serafins voam pela sala,
mordiscando teus lábios de esfinge
indecifrável, gerando fetos fantasmas
envolvidos pela fumaca do cigarro.

II

ó homens de gestos rudes,
entoando salmos diante
de um altar de pólvora,
tao compenetrados nas
estações de uma via-sacra
de destruição, onde a compaixão e
a verdade são decapitadas
em cada postagem do
facebook ou instagram,
sob o riso de um novo
profeta chamado algoritmo.

ó mundo tão velho em sua
tao alardeada modernidade,
mundo que me abriga,
que habito,
cansei de ouvir
teu suspiro, teu grito.
tu que jazes imolado
sob as rodas do canhão,
tua tristeza é o mote
do poeta e sua canção.

ó sacerdotes, canalhas bem falantes, carregando em seus bolsos o esperma
de um deus tragicômico em plena crise
de delirium tremens.

ó grandes cidades, com seus bancos acumulando capital, com seus famintos encarcerados, com seus velhos sentados nos parques, colecionando crespúsculos,
com seus habitantes vivendo sob um século de cristal, com seus budistas contemplando out-doors.

ó governantes da terra: permanece
em nós este soco nao dado no rosto da vida.
Gama, 11.03.22
Fernando Freire

Conheça o autor

Fernando Freire, poeta, prof de História, publicou os livros de poesia “Zoomboomzungu”, “Nesta hora incerta” e “Rua da memória 610”. É membro do coletivo de poetas, “Os três mal-amados” foi premiado em duas edições do Prêmio SESC de Poesia e no Concurso de Poesia da Fundação Cultural de Mato Grosso.

Conteúdo atualizado pela equipe Essenciar

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