Cheguei devagarzinho como se espera um dia há muito sonhado.
Ele se aproximou lentamente de mim, com o olhar de quem nunca me esquecera.
Senti então algo estranho como se não estivesse na terra e não conseguisse me equilibrar. Só conseguia sentir um mistério, sem muita lucidez, mas aquele momento era divinamente diferente. Não havia um tempo certo para isso, nem consegui me fixar na época. Não sabia se era passado, presente ou se seria o futuro.
Tinha convicção, no entanto da sensação agradável que sentia, misto de inquietação e ternura profunda que parecia se espalhar por todo o meu corpo.
Com os olhos fechados ainda, a única coisa que conseguia enxergar era aquele rosto que estivera sempre em meus pensamentos e em meu coração. Mas quem seria?
Em meu consciente parecia alguém que eu convivera indefinidamente. E de repente como num passe mágica lembrei-me dele. Não seriam os mesmos traços, mas era ele certamente.
Tudo muito indefinido e compreendi então porque embora não o amasse, ele sempre trazia horas de encanto, alegria e até sensualidade. E porque sempre me deixara envolver por suas palavras e sua voz.
Deixei-me ficar imóvel, aturdida, pensando em dias tão próximos em que o ouvi falar e transmitir aquele carinho que sempre me emocionava, mas não queria abrir os olhos com medo de que não estivesse ali e fosse tudo uma ilusão de minha mente ainda inebriada pelo sono. Mas seria ele? Nossos encontros eram sempre tão sutis e rápidos, intensos, porém momentâneos que tinha perdido a noção do concreto.
Como era boa a sensação de não realidade às vezes, de silêncio e de sonho, de estar sozinha sem que ninguém possa perguntar: “O que está pensando?” Como era delicioso navegar pelo seu próprio inconsciente, verificar o que se passa dentro de você e depois voltar à tona restaurada e feliz com a certeza que descansou seu cérebro sempre tão ocupado!
Como é maravilhoso saber que temos uma faculdade que ninguém é capaz de penetrar que são nossos próprios pensamentos, lugar que realmente contém privacidade e é impenetrável. Como era indescritível essa lassidão envolvente e mágica.
Enxergar na escuridão, não ver o que quer ignorar, sentir o colorido que inebria são também sensações que se multiplicam.
E ali naquele momento, eu o via, sentia, experimentava seus carinhos que me dominavam sem que ele pudesse imaginar que eu o queria verdadeiramente. Uma loucura que me consumia e ao mesmo tempo descansava e fazia com que me relaxasse completamente. Quando abri os olhos o sonho acabou. Estava ele ali tão perto de mim que podia tocá-lo a um simples movimento da mão, mas perdera o encanto. Não havia mais magia. E no seu lugar surgira a realidade em sua forma convencional e sem a sedução que me fascinara. O encanto se fora.
Vânia Moreira Diniz