Quando o vi, o rosto abatido,
Onde a fome rondava cruel,
Os olhos a contemplarem
Infindas distâncias, indagando,
A razão de sofrimento e dor,
Não pude sequer lhe responder.
Quando o vi, as costelas aparecendo,
O espectro da fome lhe rondando,
Pernas finas e sem músculos,
Dificuldade na fala lenta e suave,
Já não entendia o que fazíamos aqui,
Num mundo de exclusões assustadoras.
Quando o vi, o olhar fixo e úmido,
Como a pedir auxílio nessa vida inclemente,
O desalento, o desespero a transparecer,
A aflição inútil de ver o filho com fome,
Os ruídos do choro manso transbordaram,
Num último murmúrio de incredulidade.
Quando o vi , deitado e sem forças,
As costas feridas e maltratadas,
A fragilidade e inconsciência a persegui-lo,
A lágrima lenta descendo involuntária,
E mesmo assim olhando-me suplicante,
Enquanto seu corpo desfalecia progressivo,
Quando o vi, a indignação se me apoderou,
Senti egoísmo e individualismo na humanidade,
Ajoelhada pedi que me perdoasse,
Por tantas vítimas da miséria que não vejo,
Pelo conforto que me cerca e desejos satisfeitos,
A fome que não sinto e as alegrias que tenho.
Quando o vi pedi perdão pelas incoerências,
Que a existência é capaz de proporcionar,
Os contrastes loucos e desesperantes,
O horror da ausência de um teto digno,
Quando o vi, pedi que me perdoasse,
E prometi que lhe daria a mão e o alimento
E não esqueceria jamais dos excluídos.
Vânia Moreira Diniz