
Logo que cheguei à capital, vivi por longos anos ao lado de uma família que me amparou durante a delicada separação dos meus pais, irmãos e amigos que deixara no Rio de Janeiro. Tratava-se de um casal de meia-idade e sua filha, a quem eu já conhecia do Rio. Originários de Corumbá, cidade próxima à fronteira com a Bolívia, às margens do Rio Paraguai, eles despertaram minha curiosidade especialmente pelo sotaque peculiar e pelo uso frequente do artigo masculino antes de palavras femininas. Nossa conexão foi imediata e genuína. Posso afirmar, sem hesitação, que Dona Ramona representou para mim uma verdadeira “mãe brasiliense”. Embora todos me tratassem com imenso afeto, ela demonstrava um cuidado singular e constante em todos os momentos da minha jornada na capital.
Assim como a pronúncia deles me intrigava, eles apreciavam meu sotaque carioca, ressaltando-o com sorrisos. Eles se tornaram uma verdadeira família para mim, e minhas filhas pequenas adoravam visitar aquela casa acolhedora. Em momentos de gripe ou qualquer indisposição, essa senhora me mimava com carinho, preparando mingaus saborosos e confortando-me com um chá caseiro e delicioso.
Jamais olvidarei o sentimento inesquecível com que essa família nos envolvia, a mim e aos meus. Posso dizer, sem sombra de dúvida, que ela dedicava a mim o mesmo zelo que dispensava à própria filha. O marido também me dedicava uma atenção especial e adorava as crianças. Recordo-me de quando ele adoeceu; ninguém conseguia convencê-lo a procurar um médico, e me pediam para interceder. Ele sempre atendeu a todos os meus pedidos.
Era um paraguaio de maneiras rústicas, que por vezes manifestava um temperamento difícil, sempre contornado pela serenidade da esposa, mas possuidor de um coração generoso.
Infelizmente, ambos partiram para outra dimensão. Primeiro ele, e há pouco tempo, minha querida “mãe de Brasília”. Jamais deixava de levar-lhe belos presentes quando viajava ao Rio ou a outros lugares, e tive a oportunidade de acompanhá-la em algumas viagens a Belo Horizonte, cidade que ela tanto desejava conhecer. Sentia-me incapaz de retribuir tamanha amizade, uma dedicação que perdurou por anos. Minha mãe, no Rio, ficava mais tranquila ao saber que tínhamos em Brasília uma pessoa que nos dedicava tanto amor.
Jamais poderei esquecer esse casal que preencheu minha vida com solicitude e conforto emocional. Além disso, a filha deles é como uma irmã para mim, e ambas compartilhamos a mesma saudade.
Ontem foi um dia de intensa nostalgia. A falta que ela me faz inunda meu coração com lembranças e momentos significativos vividos em Brasília, e com o conforto que me levava a agradecer a Deus por tê-los encontrado durante todos aqueles anos singulares.
Vânia Moreira Diniz – 29/04/2025
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