Ele estava a dois passos de mim e me olhava como se quisesse me abraçar. Há muitos anos não o via e agora ao perceber aquele homem tão bonito que eu tivera a ilusão de amar, sentia que o que restara para mim fora apenas uma terna lembrança. Terna, mas distante. Sentindo seus olhos concentrados em meu rosto imaginei que estivesse querendo captar o que se passava naquele instante. Estava simplesmente sentado atrás de uma mesa de executivo e cuja porta eu abrira por engano quando na verdade quisera visitar outra pessoa. Mas algo além da surpresa e do chamado dele me fizeram entrar na sala.
Fui me aproximando devagar até que ouvi o som da sua voz:
– Você não mudou nada. Continua a mesma mulher pela qual me apaixonei!
– Então ambos não mudamos…
Ele riu, mas o som me pareceu apenas um arremedo da gargalhada que ele quisera encenar. E me perguntava o que me parecia bizarro naquela cena inesperada.
-Continuo apaixonado por você e fixado e fascinado pelos seus olhos.
Recordei, então nosso relacionamento tempestuoso perguntando-me se ainda havia muito da antiga intrepidez em seu temperamento impulsivo. E imaginei que sim, só que compreendi que parecia ter receio de alguma coisa. Mas não tinha certeza.
-Acho que hoje podemos ser amigos embora depois de nosso último encontro nunca mais o tenha visto.
Seus olhos grandes e escuros me pareceram ainda mais negros com a sombra das recordações a perturbá-lo e perguntei-lhe sem me conter
– O que há com você? Aconteceu alguma coisa além desse nosso encontro casual?
-Já foi há alguns anos, mas me responda. Foi morar em outro lugar?
-Sim, por uns tempos. Mudança de emprego e também de lugar.
-E nunca mais pensou em mim ou quis saber notícias?
-Preferi assim. Reatamos várias vezes nossa relação por aquela paixão que nos consumia, mas sabíamos ambos que não daria certo. Nossos temperamentos sempre foram opostos. Tínhamos que aprender a viver sem ela.
Quando o fixei seu rosto estava devastadoramente amargurado enquanto me perguntava
– Então não soube de nada?
-Nada o que? E estava ansiosa quando fiz a pergunta
Ele não respondeu. Apenas deu um impulso à sua cadeira de executivo e chegou até perto de mim, num segundo tão rápido que tive a ilusão de estar tendo um pesadelo.
Suas pernas imóveis na cadeira pareciam inertes e frágeis debaixo da calça leve e não sei como nem porque lhe perguntei ainda:
-Como aconteceu isso. Não pode andar?
Algumas lágrimas que ele não conseguira impedir desciam de seus olhos enquanto dizia:
-Tortura maior foi imaginar que você tinha ido embora para não me ver depois do meu acidente.
Permaneci calada, enquanto a dor tomava conta de mim, transtornada e petrificada, tentando compreender por que razão não fora me despedir quando resolvera definitivamente mudar de vida e de cidade. Sentira desejo e lutara contra isso. Por quê?
Vânia Moreira Diniz
Conteúdo atualizado pela equipe Essenciar