
Minha infância foi marcada pelas tradições de um colégio católico, e as celebrações da Semana Santa permanecem vívidas em minha memória desde tenra idade. Naquele período, tínhamos aulas de religião diariamente, uma disciplina obrigatória na instituição. O evento que me impressionou profundamente, por volta dos seis ou sete anos, foi a Paixão de Cristo. Coincidentemente, nessa mesma época, minha avó paterna faleceu precocemente. A crucificação de Jesus me causava grande impacto e, na minha inocência, conectei os dois acontecimentos, sem compreender totalmente a natureza da morte. Diziam-me que os entes queridos ascendiam ao céu para estar com Deus e os anjos, mas a ideia do ‘nunca mais’ me perturbava intensamente.
O que significava esse ‘nunca mais’? Eu me indagava como seria possível não ver mais as pessoas que amávamos. Essa reflexão me atormentava, e um medo profundo da morte começou a me assolar. Despertava no meio da noite, em prantos, dominada pelo temor de morrer. A tortura infligida a Cristo também me impressionava sobremaneira. O receio que me consumia era o de não conseguir abrir os olhos ao amanhecer.
Creio que essa foi minha primeira experiência traumática, embora as pessoas ao meu redor insistissem que tal apreensão era infundada, dada a minha pouca idade. Eu vivenciava um pavor constante de perder meus pais e nunca mais poder vê-los.
Recordo-me da especial atenção que meu pai dedicou ao meu sofrimento. Conforme eu conseguia expressar meus sentimentos por escrito, passei a relatar, de maneira infantil, o que me afligia. A morte se apresentava como algo aterrador naqueles momentos. E lembro-me que a narrativa explícita da morte de Cristo povoava minha mente com inúmeras dúvidas, principalmente pela minha incompreensão da ressurreição.
Foi necessário um tempo considerável para que eu pudesse assimilar, sem receio, o que a existência nos reserva. Naquela época, não entendia por que toda a humanidade deveria sofrer por um erro cometido por Eva no paraíso. Tudo se confundia em minha mente, e guardo essa lembrança da infância com grande nitidez.
Vânia Moreira Diniz – 29/04/2025
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