Quando soube meu coração se confrangeu e doeu tanto ao lembrar-me daquela mulher maravilhosa, generosa, forte, bonita com tantas potencialidades e que se foi em pouco tempo, esmagada por um câncer fatal e violento como sempre. Ontem ela se foi depois de tantos sofrimentos e fico amargurada ao pensar que durante todo o período de sua doença eu jamais soube que estava mal. A notícia me pegou desprevenida e intensa.
Nos conhecemos há tanto tempo, desde crianças e no momento que mais precisava eu nem sabia! A vida é curta e jamais aprendemos a valorizar verdadeiramente as pessoas que amamos.
Há algum tempo nos encontramos e como ficamos felizes ao abraçar-nos com imenso carinho jamais imaginando que seria a última vez. Ela olhou-me docemente e enquanto trocávamos confidências me dizia com entusiasmo
-A vida é boa! Mesmo com todas as tristezas. Elas são mais lembradas porque machucam, mas as alegrias são maiores!
Durante algum tempo pensei em sua frase otimista imaginando se ela tinha razão.
Recordo-a garota, os cabelos compridos e lisos, o olhar doce e impetuoso, a palavra fácil e gentil, a voz harmoniosa e meiga. Recordo-a novamente sempre muito alegre o sorriso generoso, encontrando uma desculpa para os defeitos de todos que se acercavam dela. Era uma pessoa especial. Especial e rara.
Lembro-me de nossas férias cheias de tantas novidades, as risadas ecoando talvez na esperança de que toda a vida a felicidade nos acompanhasse sem interrupção.
Nunca esquecerei seu jeito há um tempo destemido e frágil, a garra com que enfrentava os pequenos problemas diários, a confiança indiscriminada que sentia pelas pessoas e a certeza que tinha de seu sucesso e felicidade.
Sem querer enquanto as lágrimas surgem abundantes e o nó na garganta maltrata e magoa, lembro-me de que dizia que jamais ficaria velha. Uma vez respondi enquanto ela me olhava silenciosamente:
-Como vai fazer? Morrer antes? Ou existe uma mágica que quer me ensinar?
-Vou morrer antes, Vânia. Não sei como, mas vou morrer antes. Não que eu queira, mas tenho certeza de que vou. Alguma coisa me diz. Tenho que andar rápido e fazer todas as coisas que quero.
Realmente Suzana tinha uma urgência de realizar imediatamente tudo que se propunha a fazer. Parece que vivia na certeza de que ia morrer no dia seguinte. Um dia vi sua mãe lhe falando:Por que a pressa Suzana? Tem toda uma vida a sua frente.
E ela sempre sorrindo respondia como se fosse uma brincadeira de mau gosto:
– Não sei até quando estarei aqui.
Ficava triste todas as vezes que ela dizia isso talvez porque só nessas horas pensava que tínhamos um limite. E minha querida amiga realizou grande parte do que ambicionava. Na última vez que a vi não falou diretamente nesse assunto, mas com seu jeito de querer fazer várias coisas ao mesmo tempo dizia:
– Estou trabalhando tanto, minha amiga. Queria que o dia tivesse mais de vinte e quatro horas.
E referindo-se à minha mania de trabalhar à noite e dormir sempre muito tarde completou:Adoro quando quero falar com você de madrugada e tenho a certeza de encontrá-la alerta, Vânia. Detesto o silêncio que a madrugada costuma trazer. Não gosto de saber que não posso encontrar com ninguém nessa hora e da inércia que a noite sugere.
Olhei-a carinhosamente e então ela me disse que pretendia fazer um curso na Alemanha e que talvez durante uma grande temporada não nos encontrássemos.
Ambas ficamos melancólicas a olhar-nos como se o tempo tivesse acabado e começamos a recordar a nossa infância e adolescência feliz. Logo, porém nos recuperamos e fizemos planos para o futuro que nos esperava.
Foi a última vez que a vi há seis meses e hoje inundada de saudade e impotência diante da vida como sempre constato, peço que seja feliz onde esteja e consiga realizar, vibrar, entusiasmar-se e se sentir plena. Onde será esse lugar? Mas seja onde for sei que encontrará uma razão necessária para sua presença tão querida e exuberante.