Quando o conheci eu tinha por volta de cinco anos de idade. Ele era filho de um cliente de meu pai e teria aproximadamente vinte anos. Achei-o fascinante com seus traços orientais e a intensa sedução que o acompanharia durante toda a sua vida. Tinham uma casa de objetos chineses que eu adorava. Quando minha mãe ia até lá gostava que eu a acompanhasse porque via o deslumbramento com que eu olhava as pulseiras e jóias de marfim que eles vendiam ao lado dos objetos maravilhosos de ornamentação.
João Wang e eu embora tivéssemos uma diferença de idade marcante ficamos grandes amigos. Ele gostava de me carregar no colo para que visse os pequenos objetos nas prateleiras altas e inacessíveis para minha altura e que me fascinavam. E eu me encantei verdadeiramente por aquele rapaz tão diferente cujos traços bonitos me empolgaram e que tinha indubitavelmente uma magia no modo encantador de se conduzir.
Muitas vezes quando ia à minha casa ficava brincando comigo, líamos juntos livros infantis e ele então me contava histórias interessantes que me transportavam ao mundo da fantasia. Gostava de olhá-lo interpretando cada movimento que fazia e muitos anos depois continuaria a admirar o seu modo sofisticado e o bom gosto natural de sua personalidade.
Aos poucos fui deixando de ver o rapaz, pois eles haviam fechado sua casa de comércio oriental e como acontece muitas vezes se distanciaram da minha casa. Seu pai havia morrido e Wang estudando e trabalhando andava por outros caminhos.
Muitos anos depois um amigo comum numa reunião nos apresentou. Olhamo-nos e embora não o conhecesse sua figura me pareceu extremamente amiga e atraente. E ele imediatamente simpatizou comigo. Parecia-lhe que meus traços eram conhecidos e ficou longo tempo olhando para mim até perguntar:
-Você é filha de um advogado?
-Sim, quem é você?
-Jender Wang. Seu nome é Vânia?
Meu coração batia com emoção quando respondi
– Sim Wang.
Abraçamo-nos com carinho e parecia que voltávamos aquele tempo tão especial. Ficamos assim alguns segundos até que ele disse:
-Carreguei você no colo sabia? Só que parece que ficou mais alta do que eu. Como pode lembrar de mim?
– Não sei. Meus pais falavam sempre em você. Intuição E como está a sua vida?
– Não moro mais no Rio. Moro em Brasília. Tenho dois filhos. Alguns anos mais jovens que você.
Fiquei olhando aquele homem que me conhecera tão pequenina e que me dava naquele momento uma emoção imensa. Alegrias que a vida proporciona.
-Vânia, creia que a vida é um prazer. Constituída desses momentos especiais. Momentos que não se pagam e que não voltam jamais. Ela proporciona tristezas, minha querida, porém esses prazeres são mais intensos, pode crer. A sensação é inolvidável.
-Seus pais estão bem?
-Sim. Estão bem. E você tem sido feliz?
-Não sei, Vânia. Mas um acontecimento como esse vale como já lhe disse outros que não são tão memoráveis. Não esqueça disso. Pelo menos posso lhe dar essa orientação já que tenho no mínimo mais experiência que você.
E foi realmente um prazer. Até ele morrer de enfarto e ainda prematuramente há poucos anos encheu minha vida de amizade, carinho, doçura e sou uma grande amiga de sua mulher que me trata como verdadeira filha e de seus filhos com quem convivo permanentemente.
Nunca o esquecerei. A vida também indubitavelmente é um prazer. Às vezes por um instante, mas um prazer. E um prazer indescritível.
Vânia Moreira Diniz
Conteúdo atualizado pela equipe Essenciar