Eu tinha dez anos quando li pela primeira vez Érico Veríssimo. Como sempre meu pai resolveu fazer-me uma surpresa mandando uma coleção dos belos livros do grande escritor. Contou-me um pedaço de sua biografia porque achava que o livro seria muito mais interessante se eu conhecesse um pouco do autor.
Concordo com ele. Quando sabemos algo acerca das concepções, idéias e sentimentos de quem escreve parece que a leitura se torna mais consciente. E eu amei Érico Veríssimo simbolizado na jovem Clarissa. Uma menina de dezesseis anos com suas dúvidas, medos, sonhos, devaneios intensos e timidez. Misturei-me às suas fantasias de uma maneira absolutamente absorvente e quando um pouco mais tarde ingressei em seus outros livros como” Olhai os lírios dos Campos” senti o drama da personagem Olívia tão envolvida em sua paixão. Aliás, esse livro de Érico suportou críticas incríveis. Mas vendeu de forma extraordinária. E os livros do famoso gaúcho de Cruz Alta fizeram sucesso. Modesto ele disse numa entrevista antes de morrer que seus trabalhos eram superficiais o que não é verdade.
Quando um dia recebi mais um pacote dessa vez com as obras de José de Alencar, meu coração se rendeu ao seu tom romântico e diverso. Lembro-me que uma vez deliciando-me com o fascínio de “Lucíola” no colégio na fome de absorver o máximo possível a vida da triste moça fui admoestada seriamente e naquele momento tiraram-me minha fonte inesgotável de momentos agradáveis. Recordo-me que no instante que o fizeram meu impulso maior foi protestar contra aquele ato arbitrário e perguntei magoada
-Por que não posso ler? Não é o que vocês pedem tanto?
A jovem professora olhou-me estranhando a resposta para em seguida retrucar
– Mas não livros como esse!
-É José de Alencar, um dos maiores escritores brasileiros!
-Nada lhe perguntei, Vânia e não me responda nesse tom.
Nesse dia entendi que as pessoas adultas não aceitavam opiniões contrárias, mesmo que fossem coerentes e me propus a desbravar com mais ansiedade o famoso e genial escritor cearense. Amei-o talvez não tanto quanto a Monteiro Lobato que tinha sido e continuaria a ser minha maior e irresistível paixão. Uma paixão moldada aos nove anos de idade e desenvolvida pelo talentoso paulista com uma perícia inolvidável. Uma paixão absorvente, inesquecível e que além de tudo me dera conhecimentos que nem a própria escola soubera transmitir com essa garra comunicando aquele inexcedível prazer.
Não posso começar a falar desse escritor querido sem me estender de uma maneira irresistível. Ele era além de talentoso, apaixonado por tudo que fazia. Contista, sociólogo, romancista e o maior contador de histórias infantis de todos os tempos revela-se em “Poço do Visconde” o defensor do ferro e do petróleo. Sofreu com as forças contrárias e com belicosidade e extrema força, coragem e sabedoria quanto mais era combatido mais queria provar o vigor de sua tese.
Com esses três grandes autores iniciando minha incursão pelos meandros da leitura não foi difícil tornar-me uma fã ardorosa de sua prática. Não há nada que nos leve mais profundamente ao encanto do imaginário do que uma boa leitura. Ela nos renova e deixa que percorramos com incrível simplicidade mundos diversos, atraentes e maravilhosos, aumentando extraordinariamente nossos próprios conhecimentos e não deixando que o vocabulário empobreça lamentavelmente.
Quando ainda criança entendi o poder secreto que nos transmite a leitura e jamais deixou de ser para mim uma fonte prazerosa dos momentos inesquecíveis em que bebo sua água cristalina e poderosa.
Vânia Moreira Diniz