Não sei se sou uma escritora. Não sei sequer se me faço entender quando meu pensamento se concentra de tal forma que não sei quem sou. Mas enquanto estiver querendo descobrir tudo ao meu redor, enquanto precisar disso para que possa ser “gente” e sentir sangue circular em minhas veias, continuarei escrevendo. Sempre precisei juntar as letras e construir em frases minhas ideias até mesmo quando um susto e uma dor me fizeram perder a voz. Perdi a voz, mas não o pensamento que formava imagens as mais estranhas. Imaginei que haveria vida enquanto eu escrevesse.
Já imaginou como é maravilhoso poder dizer o que sinto no meu corpo, as sensações dos meus sentimentos e cada dia que se extingue e que me aproxima mais da morte? Uma sensação antiga, ver meu pai trabalhando numa máquina elétrica de escrever, num movimento quase alucinado, meu irmão mais velho se afastando das mesmas letras que eu queria dominar? E ali a casa que explodia de agitação e eu me perguntando porque eu era eu.
Não compreendia exatamente a razão da existência apenas que eu precisava rapidamente passar para o papel tudo que me rodeava. Desde a perfeição, o mais puro requinte até a mais horripilante destruição.
As ruas pareciam regorgitantes e, no entanto, lembro-me daquela escura e sem sol não sei onde e quando mas ficou tatuada em mim em um dia longínquo e morno em que não sabia porque exatamente sentia os rostos ao meu redor amargo e percebia seus olhos fundos e indecifráveis.
Não, não vou me esforçar para ver só o colorido quando percebi a dor ou a miséria, a beleza e a feiúra, os gestos doces e aqueles que me assustavam de grosseria insustentável.
Lá longe existia o homem mau, que me feriu, que me magoou e quantos assustaram as menininhas e como era feio, parecendo um animal.
Queria o silêncio, o escuro, o esquecimento, o alívio da ferida que me machucava…
Ah mas como o sol já me alegrou no passado e no presente enquanto o sentia e sinto batendo no meu corpo e as risadas que me fazem bem, deixam-me em delírio, que maravilha é viver, meu Deus!
Esse contraste que sempre me fascinou ou torturou, um dia depois do outro, a criança que cresce, aquele que se torna velho, poder pensar sem censuras e imaginar fantasias porque ninguém pode enxergar. Como é bom viver nessas horas em todas os segundos, enquanto sentimos a tontura que se apodera e nos faz girar, girar, girar….
O despertar saber que mais um dia me espera e sinto, entrego-me à minha própria sensualidade, pensamentos eróticos, eletrizantes, nessa luxúria de sentir meu próprio corpo e a voluptuosidade me dominando…
Preciso escrever porque preciso viver…
Só isso. Sobrevivência. Só por isso.
Vânia Moreira Diniz