Enquanto teclo, trazendo meus sentimentos para o mundo real, considerando as emoções, pensando no irremediável, sofrendo com as adversidades, lamentando os ideais frustrados, e pedindo que apesar de tudo, ainda hoje consiga vibrar com as alegrias tantas e tão presentes, eu me volto para mim mesma.
Lamento esse momento de egoísmo em que tenho que me ouvir, sentir ou chorar; lamento a memória que me faz lembrar do sofrimento de alguém que amo, criança e inocente e que está passando ou cumprindo uma árdua missão. Lamento!
Vejo-a, olhos azuis e profundos sempre distantes, nariz perfeito, pele suave e rosada e cabelos lisos e bastos. Sinto-a com sua ausência de uma realidade que não pode atingir, e me pergunto por quê? Contemplo-a na distância de seus pensamentos e na sensibilidade aguda e inexplorada. Enxergo o futuro, sem, no entanto, me deter em imagens ou situações, visualizando apenas o que de profundo ocorrerá em seus devaneios cuja proporção, não podemos avaliar.
Sinto-me egoísta, pensando nesse sofrimento e me arredando sem “me dar” antes do início de uma solidão que preciso. Sinto-me individualista, ao deixar que as lágrimas desçam, mas sem me voltar para um mundo que está prestes a explodir em misérias, dor, guerras, violências, incompreensões e maldades. Devo prosseguir mesmo que meu íntimo me peça para ficar. Devo continuar mesmo que precise dessa nostalgia passageira. Devo esquecer os meus males ainda que a angústia esteja palpitante e caminhar para tanta gente que estende a mão procurando apoio, segurança, fortaleza ou simplesmente outra mão confortadora e quente.
Hoje, talvez seja o meu dia de egoísmo, de concentração, girando em volta da minha própria luz que por vezes parece embaçada em momentos de reflexões profundas.
O dia de liberdade de poder esquecer as misérias humanas e me voltar para mim mesma num gesto estranho e inusitado.
O dia em que peço a privacidade envolta numa doçura que sempre conheci, e que me faz lembrar a pequena e tão querida Júlia.
Hoje é meu dia de meditação intensa em que me permito esquecer, rir e chorar, amar ou ficar indiferente, mas sempre conquistando a força que me levará a caminhos contrastantes. E então retroceder restaurada para abraçar o universo que distante me ilumina, alcançando o horizonte que vislumbro ainda inebriada.
Hoje sim. É meu dia de privacidade…
Vânia Moreira Diniz